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Férias na era digital: novas formas de descansar, trabalhar e recarregar energias

Férias na era digital

Este artigo foi inspirado num post que publiquei no LinkedIn, onde recebi dezenas de comentários com perspectivas muito diferentes sobre o futuro das férias. Obrigada a todos os que partilharam as vossas experiências – enriqueceram muito esta reflexão.


Férias na era digital: o mundo do trabalho mudou, a forma como nos conectamos também — e está na altura de reconhecermos que as férias tradicionais podem já não servir toda a gente.

Durante décadas, o modelo dos “22 dias úteis de férias por ano” foi o padrão. Mas será que ainda faz sentido numa realidade onde o trabalho remoto, os horários flexíveis e a cultura digital alteraram profundamente os nossos ritmos e necessidades?

É isso que vamos explorar.

Como são as férias na era digital? 

A transformação do trabalho — com o crescimento do trabalho remoto, da semana de 4 dias e da flexibilidade horária — trouxe também uma nova forma de encarar as pausas.

Hoje, falar de férias na era digital não é apenas falar de “desligar 3 semanas seguidas”. É discutir:

  • Como recarregamos a energia;
  • Que tipo de descanso precisamos;
  • Se é possível desligar num mundo onde estamos sempre ligados.

Com estas mudanças têm surgido novos formatos de férias, mais adaptados aos estilos de vida atuais. Mas será que funcionam para toda a gente? E mais importante: será que estamos a confundir flexibilidade com disponibilidade constante?

Novos formatos de férias na era digital

Workation: trabalho ou férias?

O conceito de workation ganhou popularidade durante a pandemia, prometendo o melhor dos dois mundos: produtividade profissional com mudança de cenário.

Existem vários tipos de workation: desde uma pausa de 2 ou 3 dias, enquanto se mantém alguma atividade de lazer e profissional, até à mudança para outro país (ou países) com determinadas autorizações para permanecer a trabalhar remotamente.

Os nómadas digitais vieram difundir este conceito ao viajarem sozinhos para outros países. Já os coworks acabam por ser uma consequência desta nova realidade. 

Algumas empresas até já oferecem programas de workation de até 90 dias, que podem ser usados de forma fracionada e programados para mais de um país.

Parece interessante?

O conceito de trabalho + férias pode parecer um sonho para alguns, mas é aqui que surge a primeira questão: será que isto são mesmo férias?

Na realidade, o início da implementação deste conceito surge de sociedades em que não existe legislação que garanta os dias de férias remunerados que a legislação portuguesa prevê. A pandemia e o aumento do número de empreendedores só vieram dar-lhe mais relevância e adeptos. 

Workation e o futuro da produtividade, Pluxee

Ou seja, na verdade, este modelo surge para colmatar um gap na legislação laboral de alguns países. O que não é o caso de Portugal.

Uma leitora no LinkedIn comentou que o título dá a entender que é um mix de trabalho com férias quando na realidade é apenas a flexibilidade de trabalhar de um sítio diferente. E tem razão. Workation pode ser uma ferramenta valiosa para quem precisa de flexibilidade, mas não substitui o verdadeiro descanso.

Comentário de Lara Ramos Pinto sobre as férias na era digital

Microférias: a solução para o burnout?

As microférias consistem em pequenos períodos de 4-5 dias distribuídos ao longo do ano, em vez de 2 ou 3 semanas seguidas. 

A teoria é simples: mais momentos de renovação, menos burnout. Pequenos “resets” que podem fazer uma diferença enorme no bem-estar.

De facto, a Organização Mundial da Saúde já reconhece o burnout como um distúrbio emocional ligado a contextos de trabalho desgastantes. E é cada vez mais comum: exaustão extrema, stress crónico e perda de motivação estão a tornar-se o novo normal.

No entanto, voltamos ao debate atual: a produtividade não se resolve com mais horas no escritório. E certamente o burnout não se evita com estas pausas curtas, ainda que renovadoras.

Ou seja, descansar não é um luxo. É uma necessidade biológica que deve ser priorizada na nossa vida, mesmo nos novos formatos de férias na era digital.

Além disso, a prática das microférias é mais complexa, especialmente para quem tem filhos. Como partilhou uma mãe nos comentários: “para quem tem filhos isto não é praticável porque depois quando a creche/escola fecha, quem é que fica com as crianças?”. As instituições educativas não fecham apenas 22 dias por ano.

Comentário de Ana Cláudia Santos-Cortez sobre as férias na era digital

Férias Temáticas: crescimento ou trabalho disfarçado?

Uma semana dedicada a aprender algo novo – curso, workshop, turismo de voluntariado. – ou seja, crescimento pessoal e descanso mental numa só experiência.

Soa bem, mas será que conta como férias?

Qualquer uma destas experiências pode ser revitalizante, mas nem todos o consideram descanso. Para algumas pessoas, só desligar totalmente é que permite recuperar energia, como refere o Eduardo Lima no seu comentário.

Comentário de Eduardo M. Lima sobre as férias na era digital

Work-Life Blend: quando a liberdade vira obrigação

A propósito do conceito de work-life blend – onde trabalho e vida pessoal se misturam de forma fluida – a abordagem divide opiniões.

Por um lado, pode ser positivo em contextos maduros e com limites bem definidos. No entanto, será que esta “integração inteligente” nos permite ser mais flexíveis sem comprometer resultados, ou está simplesmente a disfarçar uma cultura de disponibilidade constante?

Um comentário foi direto: “deveria existir sim fronteiras claras entre trabalho e vida pessoal. Acho maléfico esse conceito de work life blend, pois ao final do dia, não se descansa e nem produz bem”.

No fundo, podemos mesmo concluir que estes formatos de férias na era digital têm como objetivo promover um work-life blend. Mas, será que resulta para todos?

Férias para quem? Diferentes fases, diferentes necessidades

Uma das ideias mais fortes nos comentários do LinkedIn foi esta: o descanso não é igual para toda a gente. A forma como vivemos as férias está profundamente ligada à fase de vida e ao contexto familiar.

  • Mães e pais com filhos em idade escolar referiram que o encerramento das escolas obriga a usar os dias de férias em função da logística, e não do descanso,
  • Quem está em cargos de liderança ou vive com maior stress profissional prefere pausas mais longas, de 2 a 3 semanas, para conseguir “desligar de verdade”;
  • Há ainda quem veja as microférias como privilégio de quem tem mais autonomia — ou menos responsabilidade.

Ou seja, não há uma resposta única. Mas há um problema comum: o modelo atual não serve toda a gente.

Como alguém comentou: “para si aproveitar um dia de férias pode ser estar num workshop, enquanto que para outra pessoa pode ser estar no café da rua a comer uma boa bifana”.

O que diz a lei sobre férias em Portugal (e o que acontece na prática)

Segundo o Código do Trabalho português, os trabalhadores têm direito a:

  • 22 dias úteis de férias por ano (no mínimo);
  • Obrigação de gozar, pelo menos, 10 dias consecutivos.

No entanto, a aplicação prática varia de empresa para empresa. Há contextos mais rígidos e outros mais flexíveis, e a lei ainda está desfasada da realidade do trabalho remoto, tal como comentou uma advogada, trazendo este ponto tão relevante à discussão.

Comentário de Céu Ribeiro sobre férias na era digital e na realidade portuguesa

Curiosamente, nos dias seguintes a ter publicado este post no LinkedIn, foi aprovado o Programa do XXV Governo que inclui a possibilidade de comprar dias de férias. Uma medida que surge para promover:

“Maior flexibilidade no gozo de férias por iniciativa do trabalhador, com a possibilidade de aquisição de dias de férias, com um limite a definir contratualmente entre as partes”.

A proposta do Governo é clara: permitir que cada trabalhador possa adquirir dias extra de férias, negociando diretamente com a entidade patronal. Na prática, isso pode significar uma redução no salário em troca de mais tempo livre.

Mas o que acontece quando alguém já ganha o salário mínimo? Não pode, por lei, receber abaixo desse valor – o que pode tornar esta medida inacessível para quem mais precisava de tempo para descansar.

“Há em Portugal uma armadilha de pobreza e trabalhadores persistentemente pobres. Um trabalhador não pode ser pobre!”

Programa do XXV Governo

Vamos fazer as contas: um ano tem cerca de 252 dias úteis. Por lei, tens direito a 22 dias úteis de férias. Isso significa que passas, no mínimo, 230 dias a trabalhar.

E agora, o Governo quer permitir que possas comprar dias de férias.
Continuamos assim a evitar o elefante na sala: o tempo de férias em Portugal é curto para a realidade que vivemos — e isso não se resolve apenas com mais opções individuais. É preciso repensar o modelo de trabalho como um todo.

O futuro das férias na era digital: uma abordagem equilibrada

O ideal seria um modelo híbrido que permita:

  1. Manter períodos longos de descanso (pelo menos 10-14 dias consecutivos) para uma verdadeira desconexão;
  2. Oferecer flexibilidade para distribuir os restantes dias conforme as necessidades individuais;
  3. Criar fronteiras claras entre trabalho e tempo pessoal, mesmo em formatos mais flexíveis;
  4. Reconhecer diferentes fases da vida – as necessidades de um jovem profissional são diferentes das de um pai de família.

Será utópico?

Quero acreditar que não. Complexo de implementar, sim. Impossível, não.

O descanso não pode ser um extra. Tem de ser parte integrante da cultura de trabalho.
E isso implica coragem — de trabalhadores, empresas e Governo — para repensar o modelo atual.

O que não podemos é confundir flexibilidade com disponibilidade constante. 

As férias – sejam elas como forem – devem continuar a ser um espaço sagrado para a nossa saúde mental e bem-estar.

O que pensas sobre este tema?

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