Esta entrevista faz parte da rubrica quinzenal: Segundas de Inspiração.
Histórias de quem trocou o certo pelo incerto
e de quem seguiu percursos profissionais diferentes dos convencionais.
Espero que te inspire.

Nome: Joana Rita Sousa, mas também sou conhecida por Joana do Twitter ou Joana da Filosofia. Depende do contexto!
O que fazes?
Sou filósofa e desenvolvo trabalho na área da filosofia aplicada. Também desenvolvo trabalho no campo da comunicação e da estratégia digital. Sou formadora e consultora nas áreas da filosofia e da criatividade.
Quem és tu além daquilo que fazes?
Além do que faço, continuo a ser filósofa. É a minha profissão e também a minha forma de me relacionar com o mundo. Implica uma constante atitude de espanto, de curiosidade, de investigação e de contemplação.
O que deixaste na tua vida profissional passada?
Deixei um emprego que as pessoas consideram estável e com regalias. Tinha um emprego no qual só trabalhava sete horas por dia e com um horário fixo, numa instituição bancária (tal como a Ana Sofia Rodrigues, que já passou aqui pelo blog).
Como percebeste que querias deixar o trabalho por conta de outrem?
Este emprego foi uma oportunidade que surgiu e não foi algo planeado. Para um primeiro emprego foi uma boa experiência e até me proporcionou um horário confortável para poder continuar a estudar, por exemplo. Fiz duas pós-graduações (recursos humanos e consultoria de empresas) e um mestrado (gestão de recursos humanos) durante o tempo em que desempenhei as funções de bancária. Fiz o curso de formação de formadores e comecei a dar formação.
Quando acordas à segunda e só queres que a sexta chegue – é um bom sinal de que está na hora de mudar e/ou de começar a preparar a mudança.
Quanto tempo até dares o salto?
Trabalhei na banca durante 10 anos e a meio do caminho tornou-se evidente que teria de mudar. Quando em 2006/2007 conheci a área da filosofia aplicada e a filosofia para/com crianças, pensei seriamente que poderia construir algo nesta área que me permitisse mudar de vida, ou como dizes “dar o salto”. Mantive a profissão e o projecto durante algum tempo; imagina, tirava férias para ir dar formação nos Açores ou na Madeira, trabalhava aos fins-de-semana. Viajei muito pelo país e o emprego dava-me alguma estabilidade para apostar no networking e investir no projecto. Durante algum tempo a minha postura foi: vou aproveitar o melhor destes dois mundos. E aproveitei!
Com que idade fizeste essa mudança?
Esta pergunta obriga-me a fazer contas… deixa cá ver, tornei-me freelancer a tempo inteiro entre os 34 e os 35 anos. Mais uma vez, tenho este elemento em comum com a Ana Sofia e a Elsa Fernandes, convidadas do teu blog.
Que desafios tiveste de ultrapassar para, hoje, poderes fazer aquilo que gostas?
Tive de abandonar a ideia de que ter um emprego é sinónimo de estabilidade. As várias crises vividas nos últimos 20 anos são bons exemplos de como a estabilidade é algo frágil. Encontrar estabilidade na instabilidade é um desafio constante.
Hoje em dia faço aquilo que gosto, mas nem sempre gosto do que faço. Julgo que isso é importante, ter a noção de que mesmo quando tens uma profissão com a qual te identificas e que te realiza, também fazes coisas de que não gostas tanto e que isso te alimenta para os projectos que te apaixonam. Continua a haver dias maus, menos bons, os assim assim e os muito bons. Faz parte do processo.
O que terias feito diferente?
Não sei responder a essa pergunta. Procurei tomar as decisões que me pareceram mais razoáveis na altura. Os seres humanos são muito bons a justificar o que fazem, a encontrar razões para o que fazem (algumas delas pouco razoáveis).
Não invisto tempo a pensar no que faria de outra forma, pois como não posso voltar atrás, é tempo e energia gastos em vão. Foco-me no presente.
Um conselho para quem está insatisfeito com a sua vida profissional e quer dar o salto.
Julgo que é importante fazer uma boa análise do contexto onde está integrado e o contexto para onde quer saltar e planear um tempo de transição. Ajuda muito ter em conta os nossos círculos de comparação. Se eu estiver rodeada por pessoas que só pensam em subir na carreira para ter mais e cada vez mais – e se essas pessoas foram a minha referência, pode ser frustrante se tal não acontecer depois de eu dar o salto.
Posso partilhar um excerto de um livro que recomendo vivamente? O livro chama-se Previsivelmente irracional e o autor é o Dan Ariely.
Ariely fala-nos de James Hong, um homem que ganhou muito dinheiro e que está rodeado de pessoas que também ganham muito dinheiro:
Mas Hong soube minimizar os círculos de comparação da sua vida, em vez de os aumentar. No seu caso, começou por vender o Porxche Boxster e comprou um Prius da Toyota. “Não quero a vida de um Boxster”, disse ele ao New York Times, “porque, quando se tem um Boxster gostava-se de ter um 911, e você sabe o que quer quem tem um 911? Quer ter um Ferrari”. É uma lição que todos podemos aprender. Quanto mais temos, mais queremos ter. A única cura é quebrar o ciclo da relatividade.
Dan Ariely
Uma ideia ou um sonho que gostasses de tirar da gaveta.
Gostaria muito de desenvolver um projecto de continuidade no âmbito da filosofia, com carácter intergeracional (com crianças, jovens e adultos). Também gostaria de desenvolver um projecto de filosofia nas prisões.
Podes conhecer o trabalho da Joana através do seu site e redes sociais: Twitter, LinkedIn e Instagram.